Se procurarmos no Evangelho indicação sobre o dia do nascimento de
Jesus, nada encontraremos. Na visão dos apóstolos e evangelistas, não se
tratava de um fato digno de registro; no centro de sua pregação estava a
ressurreição do Senhor. A preocupação que tinham, ao falar dele a quem não o
conhecia, era clara: apresentar uma pessoa viva, não alguém do passado. É o que
notamos, por exemplo, nos dez discursos querigmáticos (querigma: primeiro
anúncio; apresentação das verdades centrais do cristianismo) que encontramos
nos Atos dos Apóstolos. A idéia fundamental desses discursos é a mesma: “A este
Jesus, Deus o ressuscitou; disso todos nós somos testemunhas” (At 2,32).
Voltemos ao Natal. No tempo do Papa Júlio I, que dirigiu a Igreja do ano
337 a 352, é que foi introduzida essa solenidade no calendário da Igreja. Até
então celebrava-se apenas a festa da Epifania – isto é, a manifestação do
Senhor aos povos pagãos, representados pelos magos do Oriente. Ficava assim
claro que Jesus era o Salvador de todos os povos, e não apenas de um só povo. Por
que, então, 25 de dezembro como data do Natal?
O Império Romano havia decidido que todos os povos deveriam comemorar a
festa do “sol invicto”, o renascimento do sol invencível. Era invencível uma
vez que caía (morria) de noite e renascia a cada manhã, eternamente. Esse
renascimento diário era celebrado no dia 25 de dezembro. O sol era também
símbolo da verdade e da justiça, igualmente consideradas invencíveis uma vez
que, por mais que muitos tentassem destruí-las, sempre renasciam vitoriosas. O
sol, considerado um deus, era uma luz poderosa, que iluminava o mundo inteiro.
Igualmente a verdade e a justiça eram luzes poderosas para todos os povos.
Em vez de simplesmente combater essa festa pagã, os cristãos passaram a
apresentar Jesus Cristo, nascido em Belém, como o verdadeiro sol, já que nos
veio trazer a verdade e a justiça. Também ele passou pela morte, mas dela
ressurgiu, mostrando que era invencível. Seu nascimento – isto é, seu natal –,
já que não se sabia em que dia havia ocorrido, passou a ser celebrado no dia do
sol invicto.
A tradição – louvável tradição! – dos presépios é posterior: na noite de
Natal de 1223, em Greccio – Itália, S. Francisco de Assis fez o primeiro
presépio. Ele maravilha-se que Jesus, o Filho de Deus, havia-se encarnado para
que pudéssemos conhecer o rosto de Deus. Com Jesus, passamos a ter em nosso
meio um Deus que “trabalhou com mãos humanas, pensou com inteligência humana,
agiu com vontade humana, amou com coração humano. Nascido da Virgem Maria,
tornou-se verdadeiramente um de nós, semelhante a nós em tudo, exceto no
pecado” [Constituição Pastoral "Gaudium et Spes", do Concílio Vaticano II, nº. 22). Como não representar, então, seu nascimento, ocorrido numa
gruta de Belém? Ao longo dos tempos e dos lugares, cada povo foi deixando suas
próprias marcas nos presépios. [...]
O nascimento de Jesus é o fato central da história da humanidade; tanto
assim que contamos os anos a partir desse acontecimento. Na proximidade do
Natal, caminhemos ao encontro do Menino que nos é dado, para contemplá-lo e lhe
dizer: “Vimos te adorar, Menino Jesus. Estamos maravilhados diante da grandeza
e da simplicidade do teu amor! Tu agora estás conosco para sempre! Tu, pobre,
frágil, pequeno... para nós, para mim! Em ti resplende a divindade e a paz. Tu
nos ofereces a vida da graça. Teu sorriso volta-se para os pequenos, pobres e
simples. Por isso, depositamos a teus pés nossas orações, nossa vida e tudo o
que somos e temos. Olha com especial carinho, contudo, para todos aqueles que
não te conhecem e, por não te conhecerem, não te amam. Amém!”
Dom Murilo Sebastião Ramos
Krieger, scj
Arcebispo de São
Salvador da Bahia e Primaz do Brasil
Fonte: CNBB.
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